Oração, um exercício de quem tem seu prazer no Senhor

“pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres.” (Tg 4.3)

Voltando a falar de oração, vejo uma importante diretriz, para nosso correto entendimento da mesma, nessa passagem de Tiago. O entendimento atual quanto a esse exercício de fé defende que a oração é o meio pelo qual podemos mover Deus a conceder as bênçãos que tanto desejamos. Deste modo, a oração se torna uma forma de chantagem, intimidação ou mesmo de birra para muitos cristãos, principalmente para os adeptos da teologia da prosperidade.

No meu entendimento, uma das grandes dificuldades para nossa vida de oração, está, justamente, no que Tiago expõe aqui, que é paralelo ao que está em Mateus 6.24-33. Por termos o coração muito voltado para as coisas desta vida, tiramos Deus do foco de nosso prazer e objetivos e, como idólatras, desviamos o foco de nossa atenção para as coisas, sensações, circunstâncias, pessoas e até para as aparências. Não nos apercebemos, mas tudo isso nos impede de termos uma vida de oração bem direcionada e exercida, o que, consquentemente, nos leva a termos uma relação conturbada com Deus.

Segundo Tiago, esse comportamento de busca pela satisfação dos desejos é algo tão nocivo, que é a própria causa de guerras. Isso não é difícil de se imaginar, pois, se todos querem satisfazer seus desejos, não vai demorar muito para que os desejos de um entrem em conflito com os desejos de outros. A força destrutiva de tal busca leva à guerra, pois estamos tratando de ídolos, isto é, de questões tão profundamente enraizadas no coração humano, que atender tais desejos se torna um caso de vida ou morte. É claro que não é de fato, mas de sensação. As pessoas sentem que se não atenderem tais desejos irão sucumbir, quando, de fato, nada irá acontecer, apenas a necessidade de se aprender que não se pode ter tudo o que se quer na vida.

Quando levamos isso ao nosso relacionamento com Deus, a coisa toma forma de pecado e rejeição por parte do Senhor. Tiago afirma que não temos recebido por pedirmos mal. Isso não tem a ver com a forma, com as palavras, mas com as intenções. É comum as pessoas buscarem formas mais “eficientes” para pedirem algo a Deus, a fim de que ele atenda positivamente ao que se requer. No entanto, como já vimos anteriormente em outro post, não existe fórmula correta de oração, que torne certa a resposta positiva de Deus; a continuação do verso aponta para tal fato: “para esbanjardes em vossos prazeres.” O problema na oração, nesse caso, é o foco da mesma.

Se Deus criou esse canal de relacionamento com ele, é óbvio que não podemos utilizá-lo para nossos prazeres mundanos. O Senhor quer ser glorificado também em nossas orações. Recheá-las com idolatrias, ambições, desejos mundanos e birras, fugirá do real propósito da oração, nos conduzindo à negativa de Deus, portanto, ao não recebimento do que se pede. Pedir, mal, portanto, é pedir para si e não para a glória de Deus. Isso pode, de fato, ser fruto de um coração cobiçoso e afundado no pecado, ou fruto da ignorância de alguém que sinceramente tenta viver para a glória de Deus, mas erra em alguns momentos. Em ambos os casos o prazer pessoal é a grande motivação e digno da rejeição do Senhor. Mas alguém poderia argumentar, usando o texto de João 16.24, que Jesus nos ensinou a pedir em seu nome, para que nossa alegria fosse completa. Nesse caso, precisamos dar uma rápida olhadela no texto, para verificarmos se as coisas são realmente assim.

Quando Jesus deu essa declaração aos discípulos, ele estava prestes a morrer. Sabemos que isso foi algo tão devastador para os discípulos, ao ponto do Senhor prometer-lhes o outro Consolador, o Espírito Santo. Além disso, vemos que, quando o Senhor foi preso, as reações dos apóstolos foram dissonantes com todas as demonstrações de fidelidade e poder que Cristo lhes havia dado. Vemos, assim, que, a tristeza e alegria descritos por Jesus, não tinham nada a ver com as necessidades e desejos materiais dos discípulos, mas com a necessidade dos discípulos de estarem junto ao seu Mestre. Isso significa que nossos irmãos haviam aprendido a serem tão dependentes do Senhor, ao ponto de que sua ausência significaria um desastre pessoal. Essa era a tristeza para a qual os discípulos pediriam em nome de Jesus, para que o Pai providenciasse o que lhes daria a completa alegria: a presença de seu Messias.

Veja que não era de qualquer alegria que o texto nos fala, mas da principal alegria que as Escrituras nos fala: alegria no Senhor. Aqui, se torna ainda mais evidente nossa idolatria. Somos tão idólatras, que não conseguimos ter Deus como maior alegria, a ponto de não mais nos importarmos com as ambições desta vida. Algo sempre está na frente. Nossa atenção sempre está dividida entre coisas finitas; e por serem finitas, não podem nos satisfazer completamente, tão pouco a toda a humanidade, por isso, nossos prazeres nos conduzem à guerra, pois há muito pouco neste mundo para ser aproveitado, enquanto nosso Pai celestial é infinito e a todos pode satisfazer, plenamente.

Não sei se você percebeu o peso que Tiago dá a todas essas relações, mas ele não deixou alternativas, ou estamos do lado de Deus e não nos deixamos levar por nossos prazeres carnais, ou somos amigos deste mundo e deixamos o Senhor de lado. Perceba que não é à toa que nossas orações não são respondidas; quando oramos buscando tão intensamente nossos prazeres, estamos utilizando esse meio de relacionamento com Deus, para deixá-lo de lado. É uma ironia que façamos isso – e pecaminoso também: demonstrar toda nossa inimizade com Deus, através do canal que ele estabeleceu para estreitar nosso relacionamento.

Essa forma tão polarizada de relacionamento sempre foi exposta por Deus. Tiago cita um conceito escriturístico de que o Espírito que habita no povo de Deus, mostra o ciúme e a exclusividade que este tem em relação ao que é seu. Não se colocar nas mãos do Senhor e não prezar essa relação acima de tudo é a soberba humana, que perde de vista a graça que é concedida somente aos humildes. Estes não prezam seus prazeres terrenos e experimentam a fuga de Satanás de sua vida, pois se submetem ao Senhor. Essa tensão é a eterna tensão do homem idólatra que, ao invés de se submeter a seu Criador, inclina-se diante de suas paixões, desejos, prazeres, portanto, de Satanás.

Não é de se admirar que oramos e não recebemos. Oramos tendo nossas paixões como prazer, ao invés de termos o Pai como tal. Oramos buscando nossa satisfação e deleite, ao invés de buscarmos a glória de Deus. Nos alegramos em ouro e bens que a traça e a ferrugem corroem, ao invés de termos nosso coração nas coisas lá do alto. Agimos como publicanos, buscando todas as outras coisas, ao invés das coisas do Reino de Deus. Mas isso não é o pior de toda essa situação.

Infelizmente, por vezes, se pede o que não se deve, e se recebe. Não é difícil vermos pessoas totalmente voltadas para o que é terreno, enfiadas em campanhas de oração, pedindo para esbanjar em seus prazeres e recebendo. Contudo, precisamos entender que tais coisas não são bênçãos, mas maldições. Para um coração idólatra, nada mais perigoso que alimentar tal idolatria. Muitas vezes o Senhor provê coisas a nós, que só irão nos conduzir para ainda mais longe dele. Podemos ver esse tipo de ação em Romanos 1. Ali vemos que a ação de Deus sobre os homossexuais é a de entregá-los ainda mais a tais ações reprováveis. Isso significa que o Senhor, muitas vezes, condena o pecador com mais pecado, portanto, com mais ira vindoura. Perceba que, muitas vezes, conseguir o que se deseja pode não ser uma bênção, mas uma provação. Quantos não são os que estão totalmente deficientes em suas vidas espirituais, totalmente voltados para as coisas terrenas, e recebem tudo o que desejam, de modo a evidenciar o quanto os corações de tais indivíduos estão longe do Pai?

Portanto, cuidado! Fazer um pedido em oração e alcançá-lo, não é sinal de intimidade com Deus, tão pouco de uma vida de oração vitoriosa. Podemos até pensar que oramos e recebemos, mas oramos pedindo uma bênção e acabamos recebendo uma prova de que nosso prazer está nas coisas, ao invés de estar no Senhor. Isso nos mostra que a oração é um exercício daquele que tem seu prazer no Senhor; o que for fora disso não é oração, mas abuso do relacionamento com Deus.

Comentários

  1. Olá, bom dia!

    Estamos aqui pra compartilhar um pouco do nosso ministério e conhecer também! Que Deus abençoe sua vida. Um forte abraço!



    www.geracaoresgate.net

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