Curam superficialmente a ferida do meu povo, dizendo: Paz, paz; quando não há paz. (Jr 8.11)

Jeremias proferiu essas palavras em sua profecia contra o povo de Israel, num tempo realmente conturbado daquela nação. O pecado se tornara uma prática suportável para todos. Desde a falta de misericórdia, passando pelos roubos, luxúria, assassinatos e chegando até à idolatria, via-se que ninguém se incomodava com a vontade de Iavé, mas o via como mais um dos muitos deuses: alguém que se deveria agradar com uma série de ritos.

O fato é que a mente de Israel estava totalmente tomada com seus prazeres e com suas ambições. O povo havia experimentado grande período de prosperidade e naqueles dias haviam se esquecido de quem providenciara tal prosperidade. A aproximação com as nações vizinhas mostrou-se o grande trampolim para essa derrocada espiritual.

Quando se viu grande, Israel temeu ser invadida e começou uma jornada diplomática, a fim de garantira amizade com povos vizinhos e poderosos. Seu desejo era de obter a garantia de que não seriam invadidos por esses povos e que obteriam ajuda dos mesmos em caso de invasão por outros povos. Mas o isso se mostrou o início da derrocada de Israel, que iria culminar na realização de seu maior medo: serem invadidos e escravizados.

Devido a essa aproximação com as outras nações, Israel pensou ser uma boa idéia ter grande proximidade com eles. Para que tanto ocorresse, eles logo passaram a aderir a alguns costumes e não demorou nada para que dentre esses viessem as crendices e seus deuses. O triste é que Israel se desviou de tal maneira, que não só passou a adorar deuses por meio de cultos que envolviam orgias, como eles trouxeram cultos pagãos para dentro do templo do Senhor.

Esse escárnio pelas coisas de Deus logo trouxe suas consequências. As pessoas não mais se voltavam para a palavra de Deus. Não buscavam conhecer sua Lei. Não olhavam para o próximo conforme o ensino da Lei: com misericórdia. Os profetas agora buscavam falar coisas agradáveis ao povo e ainda falavam em nome desses deuses. Os sacerdotes já eram mais zelosos com os sacrifícios e não mais ensinavam a lei como devido. Os reis se alternavam entre crentes e incrédulos que, ou remavam contra a maré, ou lideravam o povo na perversidão.

Diferente do que muitos imaginam, Israel não abandonou o culto a Deus. Eles continuavam com todos os ritos exigidos pela Lei. Contudo, passaram a viver sua relação com Iavé como mais uma religião em meio a todas aquelas trazidas dos amigos de relação diplomática. Assim como já se pode ver na vida de Saul, que tratava com Deus religiosamente, ao invés de pessoalmente, o povo, de modo geral, via nos ritos o fundamento de seu relacionamento com o Senhor, e sentia-se seguro em relação a Deus pelo simples fato de cumprir tais ritos.

Levando deste modo a relação com Deus, o povo ainda pensava que estaria protegido pela mão divina, enquanto estivesse dentro do templo, por exemplo: “Não confieis em palavras falsas, dizendo: Templo do SENHOR, templo do SENHOR, templo do SENHOR é este” (Jr 7.4). A religiosidade era tão profunda que os israelitas repetiam como um mantra a expressão “Templo do SENHOR”, para tranqüilizarem seus corações quanto às invasões e batalhas que estavam por vir. A confiança deles não estava no habitante do Templo, mas no Templo. Era uma idolatria profunda do lugar, enraizada pela prática vazia e sem qualquer entendimento dos ritos e das obras da Lei. Eles pensavam que Iavé buscava sangue, enquanto ele queria misericórdia. Eles pensavam que Iavé queria o cheiro da gordura queimando, enquanto ele queria a luta pelo direito do órfão e da viúva. Por alguma razão – pecado – as pessoas estavam com o entendimento de que com Deus se barganha e se alcança de tudo com um rito; e ainda pensam assim.

Não temos uma porção de terra a ser defendida. Não estamos para ser invadidos por nações vorazes e cheias de armas. Contudo, estamos vendo o mesmo tipo de pregação e de atitude no meio do povo que se diz de Deus. Basta uma pequena olhadela para se constatar que quase não há pregação verdadeira do evangelho. Os profetas de hoje ainda proclamam paz, quando deveria proclamar: “Serão envergonhados, porque cometem abominação sem sentir por isso vergonha; nem sabem que coisa é envergonhar-se. Portanto, cairão com os que caem; quando eu os castigar, tropeçarão, diz o SENHOR.” (Jr 8.12)

De fato, as igrejas estão abarrotadas de um povo faminto. Mas, ao contrário do que muitos imaginam, essas pessoas não estão famintas por Deus, por sua justiça, por sua paz, por sua graça. As pessoas estão famintas por curas, bens, soluções, vitórias. Mas como podem ir diante de Deus buscando o sucesso, se fracassam na luta contra o pecado? Será que Deus não foi claro o suficiente em sua Palavra ao dizer que ele não suporta mãos sujas de sangue no ajuntamento solene? Por que pessoas insistem em querer barganhar com Deus, usando suas orações, cânticos, dízimos, campanhas, correntes e o “escambal à quatro”?

Penso que a velha prática do profetismo, ao invés da profecia, tem sustentando todo esse esgoto espiritual. A pregação ensina que a vitória é certa. Os gritos proferidos dos púlpitos são contra o diabo, mas nunca contra o pecado. O evangelho não é o da companhia do Senhor nas aflições, mas da solução certa dos problemas. As profecias não são mais sobre Deus e seus planos, mas sobre mim e minha vida. As inversões são infindas, mas o fundamento é o mesmo: um coração idólatra que procura agradar outros corações idólatras.

Você já está cansando de ler sobre idolatria por aqui, mas ela é a mola propulsora de todos os pecados. Foi pela idolatria da sensação de segurança, que Israel procurou relacionar-se com outras nações e, a partir daí, passaram a cometer a luxúria, roubos, assassinatos, abandonos, mentiras, profanações ao Templo do Senhor. A lista é grandiosa e presente nos profetas maiores e menores, mas ela começa na idolatria, que levou o povo a não confiar na mão de Deus para protegê-los e os levou a temer a homens e a confiar em homens.

As idolatrias de nossos dias são tão variadas e pérfidas quantos as daquele tempo. E os profetas de hoje estão tão preocupados em agradar a massa e colherem os benefícios disso, quanto os daquele tempo. As feridas dos crentes de hoje ainda estão sendo tratadas superficialmente. Muitos estão ouvindo palavras de paz, enquanto deveriam ouvir palavras de exortação e admoestação, chamando a atenção para a forma correta de se agradar a Deus. Ao contrário disso, os púlpitos são ocupados por pregadores que colocam promessas na boca do Senhor; que incentivam o materialismo, a barganha e o comprometimento superficial e interesseiro com aquele a quem deveríamos temer, mesmo que amando.

Pregações superficiais geram relacionamentos superficiais. Relacionamentos superficiais geram idolatria, engano e a ira de Deus. Infelizmente, o deus pregado hoje não ser ira e não condena. Isso leva à falsa sensação de segurança. Certa vez encontrei com uma pessoa que frequenta uma dessas igrejas barganhadoras, e ela me disse que não cria na bíblia, não acreditava na salvação em Jesus, mas que ia à igreja para apresentar o sacrifício dela, para agradar a Deus e recebe suas bênçãos. Ela fazia o que o pregador dizia: “faça seu sacrifício, para o Senhor se agradar de ti e conceder a bênção.”

Essa falta de entendimento de como nossa vida inteira é da conta de Deus sempre foi um problema. Voltando quase ao princípio de tudo, lembremos de Caim. Não foi simplesmente sua oferta que não foi aceita, mas ele, como ofertor, não foi aceito, pois seu procedimento não era o correto. (Gn 4) Achegar-se diante do Senhor, com um culto fruto de uma vida incompatível com sua vontade é receita certa para a rejeição, mas temos mestres em maquiar tudo isso e proclamar ao povo idólatra: “Paz, paz; quando não há paz.”

Eis que vós confiais em palavras falsas, que para nada vos aproveitam. Que é isso? Furtais e matais, cometeis adultério e jurais falsamente, queimais incenso a Baal e andais após outros deuses que não conheceis, e depois vindes, e vos pondes diante de mim nesta casa que se chama pelo meu nome, e dizeis: Estamos salvos; sim, só para continuardes a praticar estas abominações! Será esta casa que se chama pelo meu nome um covil de salteadores aos vossos olhos? Eis que eu, eu mesmo, vi isto, diz o SENHOR. (Jr 7.8-11)

Comentários

  1. Boa é esta Palavra! Deus tem falado comigo a respeito dos enlatados que temos ouvidos nos púlpitos, que provocam empolgação, mas não geram arrependimento para um vida de Santidade com Deus! Que Deus abençoe a sua vida grandemente Pr. Ainda existem atalaias.

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  2. Irmão Samuel, fico feliz e tenho visto muitos pregando a verdade. Só gostaria que houvesse ainda mais ouvintes. Mas Jesus já nos ensinou que realmente são poucos os escolhidos; que o caminho é estreito e a porta também o é.

    Deus lhe abençoe também.
    Abraço

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  3. Muito boa a a reflexão, Paulo escrevendo a Timóteo, que nos últimos dias, não sofreremos a sã doutrina, mais teremos comichões nos ouvidos. E esse tempo chegou

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