Interceptando o The Intercept
O problema
inicia no título. Claramente tendencioso, quer tratar a aproximação de
calvinistas no governo como algo escamoteado, sorrateiro e vil. Nunca houve silêncio
quanto a isso. Calvinistas sempre deram seu apoio a Bolsonaro e sempre concordaram
com diversas pautas de seu programa de governo e com seu pensamento quanto a
várias questões, especialmente as que envolvem a moral e a ética, como o próprio
texto de Ronilson Pacheco (na foto) destaca.
Por detrás
desse tipo de olhar há uma falsa ideia de que a religião não pode se aproximar
do estado. Em determinado momento escreveu Pacheco:
Mas é um grupo que
manifesta, de maneira quase unânime, seu interesse no campo da cultura, dos
direitos humanos e da educação. Não disputaram ministérios mais cobiçados como
economia, saúde, justiça nem órgãos e autarquias como BNDES, Caixa Econômica,
Petrobras ou Correios. Seu alvo é onde os valores morais são disputados. E
é assim que eles estão pautando a esfera pública do país, ferindo a
laicidade do estado e sendo raramente percebidos, enquanto os olhos estão
voltados para a força dos pentecostais.
O interessante sobre a atual
visão de Estado Laico é que ela inverte a natureza das coisas. Na Reforma Protestante,
um grupo dissidente, os Anabatistas, era perseguido por diversas ideias heréticas,
mas uma de suas ideias foi sendo adotada ao longo do tempo. Naquele período era
comum a interferência do poder público estatal nas questões religiosas. Em regra,
os conselhos das cidades, as autoridades civis interferiam na igreja. Até hoje,
por exemplo, o chefe máximo da Igreja Anglicana é a Rainha da Inglaterra. Os anabatistas
defenderam que não se deveriam misturar as coisas e que, portanto, o estado deveria
ser laico, não se ligando a igreja alguma. Isso significa que, é o estado quem
estava sendo afastado das decisões religiosas, não a religião do estado.
Isso é assim e por uma razão
muito simples: religião não interfere em nada, o religioso sim. Como cidadão religioso
defendo uma visão de sociedade que reflita minha fé, especialmente em conceitos
diretamente tratados pela Bíblia. Quando penso em minha vida em sociedade não
deixo de lado minha religião. Isso pode parecer uma imposição religiosa, mas basta
perguntar-se: quando um não religioso, que possui conceitos fundamentos em
outras ideias, filosofias e ideologias pensa e age no estado, ele ignora tudo o
que pensa por entender que nem todos têm as mesmas ideias? A resposta é um
óbvio “não”.
fazer ativismo
político. Ele cita o fato com o pano de fundo de que um religioso fazer
política significa o fim do estado laico aos moldes de sua ideologia
progressista. Franklin é um cidadão e pode envolver-se com os negócios que
desejar e expressar seu apoio e pensamento o quanto desejar.
Perceba, portanto, que a
imposição é de um jogo baixo de desonestidade intelectual. No mundo dos
adultos, discutimos as ideias, recorremos a argumentos, buscando o
convencimento das pessoas e vamos ao voto – a maioria vence. No entanto, o jogo
de narrativas e o uso dos direitos da minoria são utilizados para respaldar um “cala
boca” na maioria e no direito do religioso de buscar uma sociedade que reflita
seus ideais. A questão é muito clara: eles sabem que a maioria da população é
conservadora e não aprova pautas progressistas.
Basta olharmos os resultados das
eleições, para vermos isso tomando forma. A população saiu de uma empolgação
com avanços econômicos, para uma realidade de crise e uma nova consciência
política que lançou o povo às ruas. Lula, Dilma e Bolsonaro obtiveram respectivamente:
39.455.233, 46.662.365; 55.752.529, 54.501.118; 57.796.986. Em números absolutos,
Bolsonaro foi o mais votado da história do Brasil. Sua eleição foi a mais
disputada, com a maior participação de eleitores. O ponto principal desse
período é que as discussões não abrangeram apenas questões econômicas, sociais
e demandas da população, mas a pauta ideológica estava no centro das discussões,
conversas e argumentações.
Quando o povo olhou para outras
questões, entendeu que estavam votando não só para que alguém cuidasse de seu
dinheiro. O apoio a artistas, as pautas dos programas televisivos, a tentativa
de controle da imprensa, o ensino entregue à doutrinação ideológica falaram
mais alto a um povo que está cansado de viver essas coisas no dia a dia. Por mais
que as propagandas tentassem dizer que essas coisas não existem, o povo sabe o
que seus filhos pensam e passam nas escolas. Os professores que não são de
esquerda sabem o que sofrem por não compartilharem dos ideais “revolucionários”.
Os resultados de políticas públicas de ideologias de esquerda na segurança
pública, na saúde e educação são motivações suficientes para que a população
queira ser ver livre do “progressismo”.
Isso tudo foi levantado para entendermos
que, governo algum, abriu mão de seus ideais para governar e escolher sua
equipe. Fomentaram ideologias nas artes, cultura, ensino, repartições, leis
etc. Agora, no entanto, com fundamento em um conceito errado de estado laico,
querem tornar erradas as escolhas de Bolsonaro por cercar-se de calvinistas. Daí,
utilizam outro golpe baixo de desonestidade intelectual. Apontam o criacionismo
como um problema, deixando no ar uma impressão de fanatismo e crítica insinuadora
de que o design inteligente não é ciência.
A certa altura, Ronilson
escreveu:
Em 24 de janeiro, o governo Bolsonaro passou a presidência
da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Capes,
para as mãos de Benedito Guimarães Aguiar Neto, até então reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Tão logo Neto foi anunciado, parte da comunidade acadêmica e da imprensa
repercutiu os posicionamentos anticiência do que agora é o chefe da maior
agência de fomento à pesquisa no país. Neto é opositor do evolucionismo e
adepto do chamado “Design Inteligente” – um outro nome ao criacionismo que sua
turma tenta impor como teoria reconhecida que deve ser ensinada nas
escolas e universidades. Este é um risco real, mas não é o único.
Ele diz que o design inteligente
é apenas outro nome para o criacionismo. Para quem não conhece as discussões
acadêmicas essa abordagem parece legítima, porém, o criacionismo tem aspectos
teológicos e científicos – estes designados pela nomenclatura “design
inteligente”. O DI não se trata de teologia e, tão pouco, de Bíblia. Alguns de
seus adeptos nem cristãos são. São cientistas e estudiosos que entendem haver razões
o suficiente para interpretar os dados de tal maneira, que uma inteligência
está por detrás de tudo que existe. Essa parte dos estudiosos usam metodologia
científica e linguagem científica para descrever e mostrar as razões
científicas que nos leva a duvidar que o naturalismo evolucionista seja a visão
correta de mundo. Aliás, o fato de Pacheco ter ligado criacionismo com evolucionismo
demonstra sua visão míope da nomenclatura científica, não compreendendo que o DI
lida com a existência como um todo e não apenas com a origem das espécies, que
é o foco da teoria da evolução.
Outro ponto desonesto do texto é
o de apontar a tentativa de se impor algo. Não há imposição. O que se busca é o
reconhecimento do valor acadêmico dos questionamentos feitos por cientistas
adeptos do DI, levando ao aluno uma ampla discussão das ideias. Não há
tentativa de se impedir o ensino do evolucionismo, por exemplo. É o desconhecimento,
ou a descarada busca por ignorar que a pluralidade de ideias inclusive no meio
acadêmico científico que demonstra que a turma progressista usa conceitos
pluralistas e de diversidade somente quando lhes interessa. Para tanto, tentam
colocar a coisa de tal forma como se o que o DI significasse que os alunos
teriam de estudar a Bíblia e não ciência.
A associação indevida é vista em
outro ponto. Em dado momento, Ronilson escreveu:
Fora do governo, o apoio dos calvinistas ao governo é
maciço, como vimos com a Presbiteriana Central de Londrina – em que o pastor pediu
explicitamente aos membros
para assinaram o apoio a criação do novo partido de Bolsonaro, Aliança pelo
Brasil.
Ele quer colocar lado a lado a legítima
ação de um governo nomear pessoas que estejam alinhadas com ele, com a ação de
um pastor de uma igreja local em dar apoio. Dentro dos círculos da IPB a ação
do pastor de Londrina foi criticada e condenada. A IPB emitiu nota expressando
seu desagravo e não ter qualquer ligação denominacional com a atitude daquela
igreja. Outro ponto interessante, que escapa ao conhecimento de Pacheco, é que
a Igreja Presbiteriana de Londrina não tem qualquer coisa de calvinista. É uma
igreja dissidente em suas ações, pensamentos, liturgia e teologia dentro da
IPB. Há vídeos e mais vídeos mostrando práticas inaceitáveis a qualquer
calvinista. Portanto, não só a igreja não representa a aproximação calvinista
de Bolsonaro, como também não há ligação entre nomeações e a ação de uma igreja
local. São coisas distintas. Pior, especialistas já vieram a público mostrando
que nem ilegal foi a ação do pastor da igreja, ainda que condenada por outros
pastores, como o autor desse texto.
Outro ponto de desconhecimento é
seu tratamento do Mackenzie como um QG do calvinismo.
O desconhecimento do campo
religioso é reforçado por declarações sem qualquer efeito. Ao destacar a
atuação do Pastor Guilherme de Carvalho, Ronilson escreveu:
Crítico do campo evangélico progressista, Carvalho
costumava reagir fortemente quando se questionava a falta de representatividade
de diversidade étnico-racial, de gênero e regional em eventos
teológicos-calvinistas. Na divulgação desses eventos, é comum as artes dos
cartazes figurarem sempre preletores homens e brancos, quando sabemos que mesmo
entre as igrejas presbiterianas há pessoas negras, mulheres e presença em
outras partes do Brasil.
Em uma de suas respostas,
defendia tais eventos alegando que “o critério precisa ser a própria qualidade
teológica”, o que é uma outra forma de dizer que não há, ou quase não há (ou se
há, eles desconhecem), qualidade teológica em mulheres teólogas ou negros e
negras teólogas, ou menos ainda em teólogos e teólogas LGBTIs. Aliás, vale
ressaltar que dos mais de 30 nomes que assinam a tal “Carta Aberta à Igreja
Brasileira” para as eleições de 2018, não há absolutamente nenhuma mulher,
pastora, diaconisa ou missionária. Todos os signatários são homens.
Perceba a preciosidade da
retumbante ignorância do escritor. Primeiro, o pano de fundo do questionamento
é a ideia da diversidade. Diversidade não é um valor cristão. A resposta do
Pastor Guilherme reflete nossa completa despreocupação com a representatividade
e diversidade. O que importa para nós é a qualidade do teólogo, não importando
quem seja. Isso posto, lembremos de Norma Braga, extremamente respeitada,
escritora e... MULHER. Em meus tempos de seminário, havia a irmã Cláudia, que
era uma das melhores alunas do seminário. Agora, é ponto teológico na maioria das
denominações calvinistas que a mulher não é ordenada, ou seja, não pode ocupar
cargos de liderança, especialmente os que exigem preparo teológico, como
pastorado e presbiterato. No entanto, não é difícil ver mulheres dando aulas em
nossas instituições de ensino, inclusive em matérias exegéticas. Mas, de fato,
pastoras, nem pensar por razões teológicas (que venham com o blá, blá, blá do
machismo), teólogas, no entanto, já é bem mais fácil e elas estão por ai.
Agora, falar de negros é
brincadeira, especialmente para os calvinistas. Só lembrar que Agostinho de Hipona
era etíope e fonte de que bebemos a largo sorvos. Os judeus na época de Jesus, certamente, possuíam traços mais negros.
Temos pastores de diversas gerações e destaco, atualmente, um de meus
preferidos, Rev. João Paulo Tomás de Aquino. Negro, pastor e teólogo da melhor
qualidade. Em meu tempo de seminário, tínhamos professores das mais diversas origens
étnicas e sociais. Agora, os principais serem brancos não é por racismo ou desprezo,
mas pelo fato em si. E não, não há mulheres, negros, gays do nível teológico e acadêmico de Nicodemus e isso não por ele ser branco, mas por ser estudioso e ter anos de academia e pós-doutorado e horas debruçando-se sobre os livros para chegar onde chegou. Como aluno dos vários brancos que estão no circuito dos grande eventos de palestras, digo que não há nada impossível no que fazem, mas não é à toa que estão onde estão. Estudaram muito, ralaram muito para que o Sr. queira reduzir tudo isso à sua ideia de diversidade, representatividade e "igualdade".
Mencionar teólogos de linha
LGTBQ+ é o suprassumo do absurdo. É óbvio que vamos desconsiderar. Somos claramente
contra a moral esquerdista, inclusiva, que quer dizer que ser gay é ok. Sempre
teremos o pecado como pecado. Isso significa que, um teólogo que se identifica
com sopa de letras dos movimentos gayzistas jamais será considerado no meio
calvinista. Não é que a pessoa não possa ser inteligente, mas não dá para uma
pessoa ser boa teóloga e dizer que a Bíblica não é contra o homossexualismo. Basta
olhar os malabarismos exegéticos, os estupros às línguas hebraica e grega e os
anacronismos ideológicos utilizados para fazer a Bíblia concordar com a prática
gay. Necessariamente, isso fará da pessoa péssima exegeta, portanto, péssima
teóloga. Ou seja, não negamos que há boas mulheres e negros teólogos, mas gays
que se identificam com o movimento LGTBQ+, dou toda razão para o raciocínio de
Pacheco.
A preocupação do autor da
matéria do site criminoso The Intercept é verdadeira, no entanto. Como calvinistas,
entendemos a vida toda com olhar teológico e temos uma visão redimida da cultura,
buscando tirar o que é contrário à Palavra de Deus e motivar o que é favorável,
ou aceitável por ela. Da mesma forma que o autor entende que a cultura deveria
seguir seus ideais revolucionário, entendemos nós que a cultura deva seguir
nossos ideais submissos à Deus, criador do homem e do ambiente em que vive. O erro
está em achar que há um plano por debaixo do pano e silencioso. De forma alguma.
Nossos textos estão na Internet. Nossos livros estão disponíveis. Nossos vídeos
ao alcance de todos. Desejamos, sim, uma sociedade mais próxima de Deus e longe
de ideais esquerdistas, ateístas, naturalistas, evolucionistas, racionalistas,
pragmáticos e todas as outras pautas defendidas e apoiadas ultimamente pela turma
vermelha. Somos tão maus, tão horríveis, que é nos países cristãos que não é proibido
ser gay, nem se condena gays oficialmente. Estamos trazendo tempos tão
sombrios, que a morte de gays reduziu 22% em 2019.
Somos calvinistas, terrivelmente
cristãos, somos protestantes e não do movimento evangélico, somos a favor da
vida, ao ponto de apoiarmos a legítima defesa e a pena de morte. O raciocínio
contrário a essas coisas é o mesmo que vitimiza o bandido e coloca as vítimas
nas mãos destes. A crítica a Augustus Nicodemus por ser favorável a essas
coisas não nos espanta. Pensamos diferente de vocês sim. Sua moral e ética, Sr.
Pacheco, são tortas, vitimistas e hipócritas, pois, na hora de se defenderem,
seus deputados e senadores gostam de carros blindados e seguranças armados. Não
é sua moral esquerdista que nos ensinará sobre justiça social, que não foi
estabelecida em hora alguma de governos de esquerda, pois a esquerda é o
verdadeiro ópio. Inebria as pessoas com promessas de coletividade, igualdade,
fraternidade, liberdade e bem-estar social, para que os líderes demonstrem o
mesmo instinto capitalista selvagem que acusam os outros de terem.
Para nós, calvinistas, só o
evangelho, nada mais que o evangelho. Nossa esperança não está em Bolsonaro,
apenas o apoio e o desejo que a família, a moral, os bons costumes, o
conservadorismo e a verdadeira liberdade sejam preservados. Importa que sejamos
salvos por um único nome: Jesus. Está bom aqui, pois é muita ladainha a alarde
de quem perdeu o espaço que tinha e quer proibir os outros de fazer o que seu
lado fez por anos.
Comentários
Postar um comentário